quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Campo de Perizes ou de Peris? Qual o correto?



Quando se digita no Google imagem as palavras“Campo de Perizes” o que se vê são inúmeras fotos de engarrafamentos e acidentes de trânsito. Carros completamente destruídos, pessoas mortas e feridas, polícia, bombeiro e coisas do gênero. São problemas provocados por “erros” de construção cometidos em outros tempos.

A rodovia foi feita colada ao trilho da antiga Rede Ferroviária Federal S.A – REFFSA, o que se tornou uma anomalia na via, sem acostamento no sentido crescente. E para o (des)serviço ficar completo, com os dois lados prejudicados, foi colocado um outro problema, a tubulação do sistema Italuís na outra margem. Tudo isso aliado à falta de duplicação (que só agora está acontecendo) tem-se o cenário perfeito para algumas das tragédias verificadas no lugar. Mas a primeira vítima a agonizar no Campo é o vernáculo, pois o nome correto do lugar não é Campo de Perizes, como comumente citado, inclusive pela mídia.

A Expressão carece de melhor atenção, de um revisionamento.

O Campo faz parte da Baixada maranhense, formada por grandes planícies baixas, alagadas no primeiro semestre do ano, o que resulta em uma espécie de pântano setentrional do Brasil, refúgio de diversos animais e aves migratórias, que aqui descansam, alimentam-se e reproduzem-se.

A Baixada é formada por duas dezenas de municípios e possui quase vinte mil quilômetros quadrados, que reúnem um dos mais belos conjuntos de lagos e lagoas naturais do país. Lago Açu e o Lago de Viana se destacam na produção regional de pescado, de onde são retiradas anualmente muitas toneladas de diversos peixes.

Além do manguezal, existe uma vegetação típica nos campos alagados, um capim alto ou junco próprio de terreno pantanoso, o Peri. Daí o termo que designa o famoso Campo que margeia os dezenove quilômetros da BR 135 na circunscrição do município de Bacabeira/MA. Peri é o substantivo primitivo de onde deriva a discrepância Perizes.

A origem do termo equivocado é desconhecida. Muito provavelmente foi extraída de outro erro: Periz, com “z” no final. Se o termo inicial é Peri, então, segundo a gramática brasileira, forma-se o plural acrescentando-se “s” (e não “z”), resultando, então, o termo Peris. Estaria justificada, assim, a pronúncia Campo de Peris, expressão já usada por muitos. Resolvido o problema de número, resta ainda observar um detalhe: o termo é de origem tupi e deve ser grafado com dois “i”, resultando em piri, que deu nome a lugares como Piripiri, no Piauí, Peri Mirim (que quer dizer capim ou junco pequeno) e Peritoró, no Maranhão. A forma mais correta, portanto, deveria ser Campo de Piris.

Pronunciar e escrever Campo de Peris já seria um bom começo. O que não dá é para continuar a agressão à gramática com a utilização do termo Perizes, pois muita gente o faz pensando se tratar de alguma ave, como perdiz. Pronunciando o termo correto, Piris, ou sua variante aportuguesada (digamos) aceitável, Peris, estaremos prezando pela língua e cultivando uma das mais ricas línguas da América, o tupi-guarani.
Continuar pronunciando e escrevendo Campo de Perizes é negar que em São Luís se fala ou se falou o melhor português do Brasil ou que algum dia existiu uma Atenas nestas plagas de escritores e poetas.

Se no próximo ano vamos melhorar a fluidez do trânsito no Campo a partir da duplicação da BR 135, então, nada melhor que nos anteciparmos com a correta escrita e pronúncia do termo.

Salve o vernáculo, viva o tupi e o Campo de Piris ou de Peris.


Por Antonio Noberto- Turismólogo, escritor, sócio-efetivo do IHGM, membro fundador da Academia Ludovicense de Letras

http://jbazevedo.blogspot.com.br/

Incêndio devasta uma das principais terras indígenas do Maranhão


Há mais de dois meses em chamas, a Terra Indígena Arariboia, que abriga o povo Guajajara e um grupo de índios isolados Awá-Guajá, é palco de um drama de dimensões gigantescas. O fogo consumiu quase a metade do território e já atingiu algumas aldeias
Sobrevoo realizado no dia 24 de outubro pelo Greenpeace sobre a Terra Indígena Arariboia documenta incêndio florestal de proporções devastadoras (©Marizilda Cruppe/Greenpeace)
Um dos maiores incêndios florestais dentro de uma terra indígena já registrados no Brasil está consumindo um dos últimos remanescentes de floresta amazônica do Maranhão e ameaçando a sobrevivência de povos indígenas, incluindo grupos isolados. A Terra Indígena (TI) Arariboia, de 413 mil hectares, já teve mais de 45% de seu território transformado em cinzas, apesar do trabalho incessante de 250 homens que atuam para conter uma linha de fogo que chegou a ter 100 quilômetros de extensão.
A TI é a casa de 12 mil pessoas da etnia Guajajara e de cerca de 80 índios isolados do povo Awá-Guajá. Em sobrevoo realizado pelo Greenpeace no dia 24 de outubro sobre os principais focos de calor da TI Arariboia foi possível verificar o avanço do fogo sobre as aldeias e sobre as áreas de floresta densa que se localizam no coração do território, onde vivem os Awá Guajá, que estão cercados pelas chamas. O incêndio florestal já consumiu cerca de 190 mil dos 413 mil hectares que constituem a TI, o equivalente a cerca de 190 mil campos de futebol.
Veja a galeria de fotos:
https://www.flickr.com/photos/greenpeacebrasil/22507736966/in/album-72157660435235735
Acompanhada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a convite de lideranças Guajajara, a equipe do Greenpeace também esteve por terra dentro da TI Arariboia e pôde avaliar melhor o tamanho do estrago produzido pelo incêndio. “Foi chocante constatar a dimensão gigantesca da destruição e perceber que os Guajajara e Awá-Guajá são as grandes vítimas dessa tragédia”, afirma Danicley de Aguiar, da Campanha da Amazônia do Greenpeace. “Além da erradicação do fogo, a maior preocupação é garantir a sobrevivência desses povos. Muitas roças foram destruídas e o acesso à caça deve ficar comprometido, por isso os índios poderão ter sérias dificuldades para conseguir alimentos. Depois que o fogo for controlado, será necessário que o governo acompanhe de perto essa situação”, completa ele.
Mapa mostra focos de calor no interior da TI Arariboia dos dias 19 a 25 de outubro. Em pontilhado é possível ver a rota realizada pelo Greenpeace, que esteve na área entre os dias 24 e 25 de outubro. Os dados foram compilados pelo Greenpeace via dados de sensor de satélite NPP-VIIRS (Fonte: http://www.inpe.br/queimadas)
Em meio à forte fumaça que tomava conta da aeronave, Sonia Guajajara, liderança da Apib e moradora da TI Arariboia, observava incrédula o incêndio pela janela do avião: “O que vai ser do meu povo, a vida não vai ser fácil, vamos sofrer muito sem nossa floresta”, disse ela. Segundo Sônia, os Guajajara identificaram os focos de incêndio logo no início do mês de setembro e, por meio de alguns brigadistas indígenas, informaram os coordenadores das brigadas do Prevfogo, braço do Ibama especializado na prevenção e combate incêndios, na região. “Não é aceitável que os órgãos competentes, como a Funai e o Ibama, não tenham percebido o aumento dos focos de incêndio dentro da terra e tenham demorado tanto para tomar as providências necessárias para combater o fogo que se espalhava pelas aldeias”, complementou Sônia.
Os brigadistas indígenas, chamados “guardiões”, estão na vanguarda das iniciativas de proteção do território Guajajara. Desde o início do incêndio, eles se apresentaram aos órgãos do estado como uma força auxiliar para o combate, mas foram rejeitados pelo Ibama sob o argumento de que não teriam experiência de combate a incêndios e não faziam parte das brigadas do programa Prevfogo.
Madeireiros estão sendo acusados pela propagação do fogo, que seria uma represália às ações de monitoramento autônomo do território realizadas pelos índios para impedir a extração de madeira ilegal. Junto com outras terras indígenas do Maranhão, a Arariboia sofre com a invasão e o roubo de madeira de maneira sistemática. A falta de uma política eficaz de proteção das terras indígenas permite que isso aconteça e aumenta o risco de incêndios como esses: a degradação causada pela atividade madeireira ilegal torna a floresta vulnerável ao fogo.
Em outubro, o Governo do Maranhão declarou situação de emergência em 11 terras indígenas no estado. Além da Araribóia a situação se estende às terras indígenas Geralda Toco Preto, Canabrava Guajajara, Governador, Krikati, Lagoa Comprida, Bacurizinho, Urucu, Juruá, Porquinhos e Kanela. Segundo as lideranças indígenas do Maranhão, porém, há registros também de focos de incêndio em outras terras além das citadas no decreto, como é o caso da Alto Turiaçu, do povo Ka’apor.
Com a ajuda de seis soldados do Corpo de Bombeiros do Estado do Maranhão, cerca de 48 índios Guajajara trabalham atualmente na extinção dos focos de incêndio no centro da TI Araribóia. “Mesmo com todas as dificuldades de logística e comunicação, os guardiões têm sido muito efetivos no combate aos focos de calor que ameaçam o povo Awá-Guajá, se confirmando como um exemplo de bravura e solidariedade”, assinala Danicley de Aguiar.
Preocupada com as consequências dessa tragédia social e ambiental, Sônia Guajajara clama por maior integração entre os órgãos de Estado responsáveis por extinguir o incêndio na Terra Indígena. “Não há espaço para falhas, pois estas podem significar a destruição de toda a floresta e assim comprometer a vida dos povos Guajajara e Awá-Guajá.  “Não vamos abrir mão de defender nossas florestas e nossos irmãos” conclui ela.

http://www.greenpeace.org/brasil/

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Geomorfologia Costeira o caso dos manguezais nas Reentrâncias Maranhenses (2012)

Anais: Geomorfologia costeira

GEOMORFOLOGIA AMBIENTAL APLICADA À GESTÃO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO: O CASO DOS MANGUEZAIS DAS REENTRÂNCIAS MARANHENSES (COSTA NORTE BRASILEIRA)

AUTORES
Soares, B.J.G. (UFMA) ; Oliveira, M.S. (UFMA) ; Dias, L.J.B. (UFMA – DEPT. DE GEOCIÊNCIAS)
RESUMO
Analisa-se, no contexto da Geomorfologia Ambiental, a Área de Proteção Ambiental (APA) das Reentrâncias Maranhenses no que concerne à gestão dessa Unidade de Conservação, também considerada Sítio Ramsar, que reúne a maior área em extensão de manguezais contínuos do Brasil, que proporcionam o desenvolvimento de diversos ecossistemas indispensáveis para a sustentabilidade do conjunto da biodiversidade costeira do Norte Maranhense e Nordeste do Pará.

PALAVRAS CHAVES
Reentrâncias maranhenses; Geomorfologia Ambiental; Unidade Conservação

ABSTRACT
It is analyzed in the context of Environmental Geomorphology, the Environmental Protection Area (APA) of the Reentrâncias Maranhenses regarding the management of conservation this areas, also considered Ramsar Site, which has the largest area of mangroves continuous extension of Brazil, which provide the development of various ecosystems essential to the sustainability of the overall coastal biodiversity Maranhense North and Northeast of Pará.

KEYWORDS
Reentrâncias maranhenses; Environmental Geomorpholo; Conservation Unit

INTRODUÇÃO
As perturbações socioambientais em Áreas de Proteção Ambiental advêm da desconsideração das potencialidades e fragilidades dos ecossistemas para uma eficaz elaboração de planejamento visando à gestão adequada dos ambientes conservados. No presente estudo, evidenciaram-se aspectos físicos e também sociais da Área de Proteção Ambiental (APA) das Reentrâncias Maranhenses, cujos valores ambiental, social e econômico são bastante importantes para o Estado do Maranhão (stricto sensu) e para a Costa Norte Brasileira (lato sensu). Os conhecimentos integrados das dinâmicas costeiras e continentais pautados no espaço total sob análises, ao indicar suas dinâmicas e evolução conjuntas de elementos/fatores físicos, ecológicos e socioeconômicos, permitem estabelecer estratégias para a definição de atividades de uso, manejo e gestão territorial. Nesse contexto, a Geomorfologia apresenta papel integrador dos atributos ambientais regionais (AB’SÁBER, 2004). A APA das Reentrâncias Maranhenses, devido ao seu conjunto de biodiversidade terrestre, aquática e de transição e contato apresenta potencialidades paisagísticas diversas, em que pesem a beleza cênica natural, aliada ao uso de seus ecossistemas por atividades socioeconômicas e culturais. No entanto é notória a falta de políticas que possam qualificar e subsidiar os moradores a exercerem de forma mais sustentável possível suas atividades de subsistência e econômicas, considerando as especificidades dessa frágil ecorregião. Neste contexto, objetiva-se avaliar as potencialidades e fragilidades dos ecossistemas que compõem a APA das Reentrâncias Maranhenses frente ao estudo da Geomorfologia Ambiental aplicada a Unidade de Conservação (UC), contribuindo para na produção de informações sobre essa área protegida, que também é considerada Sítio Ramsar, conferindo suporte para a elaboração de políticas públicas para o território em questão.

MATERIAL E MÉTODOS
A APA das Reentrâncias Maranhenses está localizada na Costa Ocidental do Estado do Maranhão que se estende de Alcântara até a foz do Rio Gurupi, em Carutapera (MARANHÃO, 1991). Essa Unidade de Conservação costeira foi declarada, em 1993, de interesse mundial pela Convenção Ramsar e pela Rede Hemisférica de Reservas para Aves Limícolas Migratórias, sendo criada pelo Decreto Estadual nº 11.901/1991, com área aproximada de 2.680.911,2 hectares (DIAS, 2007). Foram feitos levantamentos na Biblioteca Central e do LABOHIDRO, na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), que subsidiaram as reflexões conceituais do trabalho. Foram procedidos trabalhos de campo entre fevereiro e abril de 2012 em cinco dos 17 municípios que compõem a APA das Reentrâncias Maranhenses (Cedral, Porto Rico, Alcântara, Apicum-Açu e Bequimão), em que se destacaram o reconhecimento socioambiental local. Os dados foram coletados por meio de análise de fotografias, observação direta e entrevista informais com os moradores.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A APA das Reentrâncias Maranhenses é uma UC costeira estadual, que possui origem fluvio-marinha e glácio-eustática holocênica. Essa região ecológica é estratégica, pois abriga um mosaico de ecossistemas inseridos no contexto geológico regional, com constituições litológicas que variam do Proterozóico ao Holoceno. A APA das Reentrâncias Maranhenses possui uma costa extremamente recortada e baixa, com inúmeras baías pontilhadas de ilhas, bancos de areia, canais de maré, estuários e extensos manguezais que penetram amplamente considerando-se o limite interno da influência de maré (EL-ROBRINI et al, 2006; DIAS, 2006), ocupando faixas de terras abrangidas pela foz e as margens de rios. A ocorrência de manguezais neste litoral é favorecida por uma série de fatores ambientais, como temperatura, alto índice pluviométrico, descargas de nutrientes, marés e presença de dezenas de estuários (de portes e tamanhos diversos), além da intensa atividade erosiva e deposicional. Dias (2007) afirma que o manguezal é o ecossistema de maior importância para as Reentrâncias Maranhenses por possuir uma alta produtividade primária, que concorre para atividades pesqueiras, além de abrigar espécies ameaçadas de extinção. Possui constituição florística diversificada, com predominância do mangue vermelho (R. mangle), a siriúba (A. germinans) e o mangue branco (L. racemosa). Os tipos de vegetação apresentam características próprias em decorrência das variações da composição edáfica e das ondas e marés. De forma geral a APA e seus ecossistemas estão bem conservados (HAZIN, 2008), mesmo com intensas dinâmicas da paisagem advindas pelas atividades socioeconômicas de porte regional. No entanto, alguns municípios apresentam desmatamentos pontuais para consumo de madeira, abarcando a utilização nas panificadoras como forma de lenha, construção de barcos e produção de carvão caracterizando impactos pontuais que geram fragmentação ambiental. Outro fato evidenciado é o aumento de núcleos urbanos, pastagens para criação de gado bovino, diversidade de culturas relacionadas à agricultura itinerante (corte e queima, práticas conhecidas como “coivara”). Dentre os principais problemas analisados na área, estão a pesca predatória, além da falta de planejamento turístico nos municípios, que acabam por concorrer para elevar as demandas por equipamentos e serviços afeitos que atendam ao incremento socioespacial local. Os principais impactos socioeconômicos no contexto geoambiental dos manguezais das “Reentrâncias” é a conversão das retaguardas desse geossistema natural em áreas para a carcinicultura inseridas apicuns ou salinas. Esta formação geomorfológica caracteriza-se por se apresentar um espaço biodiverso situado entre os manguezais e as terras emersas, que tem contato com o mar durante as marés de sizígia, onde os moradores acabam por aprofundar e cercar o apicum, atingindo de certa forma, as bordas dos mangues, impactando-os diretamente. A geomorfologia ambiental costeira relacionada à Gestão da APA das Reentrâncias Maranhenses indica as potencialidades e fragilidades ambientais para o uso dos solos, contribuindo significativamente através da compreensão da dinâmica das alterações do relevo terrestre dessa UC para sua gestão integrada. Para tanto, constitui-se como um grande desafio realizar o ordenamento de atividades a fim de garantir sua sustentabilidade, pois envolve concepções interdisciplinares para a proteção e preservação do ambiente atrelado à qualidade de vida da população local.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando os aspectos supracitados, o principal desafio à APA das Reentrâncias Maranhenses é o de implantá-la definitivamente como UC no que discerne aos seus objetivos e possíveis usos do solo, utilizando seu potencial ambiental sustentavelmente à geração do conhecimento necessário ao seu planejamento (plano de manejo) e consequente gerenciamento, monitoramento e fiscalização ambiental subsidiando o poder público e a sociedade civil. Os manguezais, por desempenharem um papel ambiental de destaque além de serem frágeis ecossistemas, devem ser mais bem fiscalizados e monitorados e devem ser implementadas de maneira rápida e eficaz, políticas de proibição total da prática da carcinicultura em áreas de apicuns, considerando a instabilidade naturais desse tipo de unidade geoambiental local e regional. Da carcinicultura, semi-intensiva ou intensiva, derivam danos ambientais críticos nos ecossistemas de manguezais e resultam na crescente destruição dos recursos naturais regionais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
AB’SÁBER, Aziz Nacib. Amazônia: do discurso à práxis. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2004. 320 p.

DIAS, Luiz Jorge Bezerra. Reflexões sobre geomorfologia, distribuição de ecossistemas costeiros e uso e ocupação do solo. SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOMORFOLOGIA (SINAGEO), 6, 2006. Goiânia. Anais... v. 02 (CD-ROM). Goiânia: UFG/Departamento de Geografia, 2006. 11 p.

_______. Gestão das unidades de conservação estaduais: 2007 – 2010. São Luís: Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais (SEMA), 2007. 38 p.

EL-ROBRINI, M.; SILVA, M. M. da.; EL- ROBRINI, M. H.; FEITOSA, A. C.; TAROUCO,J. E. F.; SANTOS, J. H. S. dos ; VIANA, J. R. Maranhão. In: DIETER, M. (Org.). Erosão e progradação do litoral brasileiro. Brasília: Ministério do Meio Ambiente/ Secretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos, p. 87- 130. 2006.

HAZIN, Maria Carolina (coord.). Sítio Ramsar APA das Reentrâncias Maranhenses – MA: planejamento para o sucesso de conservação. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2008. 24 p.

MARANHÃO (Estado). Decreto Estadual Nº. 11.901. Cria, no Estado do Maranhão, a Área de Proteção Ambiental das Reentrâncias Maranhenses, com limites que especifica e dá outras providências. São Luís, 11 de junho de 1991.



Publicado em 2012  em : http://www.sinageo.org.br/2012/trabalhos/4/4-518-357.html

Carta dos romeiros e romeiras ao povo do Maranhão: Territórios livres para o Bem Viver dos Povos

 
 
   
Confira o documento final da 12ª Romaria Estadual da Terra e das Águas do Maranhão, que aconteceu nos dias 17 e 18 desse mês, no município de Chapadinha: 
 
 
 
Nós, romeiros e romeiras participantes da 12ª Romaria Estadual da Terra e das Águas, saudamos a todo o povo do Maranhão. Queremos partilhar a riqueza que foi a preparação e a realização desta grande Romaria. Foram doze seminários diocesanos e um estadual, uma cartilha, a produção de um videodocumentário, debatendo e atualizando a problemática da terra e das águas no Estado à luz do novo paradigma que e o Bem Viver para todos os povos.                   ·              
 
Denunciamos o agravamento das situações de violação de direitos, de violência, inclusive institucional, das desigualdades provocadas pelo modo de produção capitalista; um modelo dito de "desenvolvimento" que estimula sonhos e privatiza os lucros; que expulsa e inviabiliza a permanência das comunidades tradicionais, dos povos indígenas, das famílias de camponeses e camponesas, das quebradeiras de coco, dos ribeirinhos, dos praianos nos seus territórios. E abre as portas para o empresariado fechando os olhos para as necessidades do povo.
 
Repudiamos o loteamento do estado para a implantação dos grandes empreendimentos:
 
- O inonocultivo de eucalipto, soja, cana de açúcar nas regiões do Baixo­Parnaíba e do sul do Maranhão trazendo como consequências  a poluição da Mãe Terra, com a morte e extinção das nossas águas, (rios, córregos, igarapés, lagos, campos inundáveis) e extinção de diversas espécies da fauna e da flora, o trabalho escravo e precarizacão do trabalho, o uso de agrotóxicos afetando as plantações dos pequenos agricultores e sendo consumido por todos através dos alimentos;
 
- A instalação de grandes empresas de mineração na região da Baixada e no Alto­Turi,  ampliando o desmatamento e provocando desastres irreparáveis nos solos e recursos naturais;
 
- O avanço do agronegócio e da atividade pecuária, aumentando a concentração da terra, os coaflitos agrários, assassinatos de lideranças camponesas, indígenas e quilombolas, a expulsão de comunidades inteiras de seus territórios;                                                                                                                                                   - A duplicação da Estrada de Ferro Carajás, o fortalecimento do polo siderúrgico com a implantação de uma fabrica de celulose na região Tocantina, aumentando os níveis de poluição, de casos de doenças degenerativas, expropriando terras, favorecendo  a exploração sexual,  o alcoolismo, sobretudo entre a juventudes;  
 
- O avanço sobre as unidades de conservação ambiental, mostrando a mão violenta do Estado que sob o manto da legalidade legitima situações imorais como concessão de licenças ambientais para desmatar e matar rios e animais e, por outro lado, inviabiliza reprodução dos modos de vida de comunidades centenárias, como o que ocorre no Parque de Lençóis Maranhenses, Parque do Mirador no Cerrado, Reserva Biológica do Gurupi, Resex Tauá­Mirim na zona rural de São Luis;
 
- A intensificação da invasão de terras indígenas regularizadas com a exploração ilegal de madeira deixando um rastro de destruição, de violência, assassinatos, impedindo a reprodução física e cultural desses povos; e nas terras que estão em processo demarcação existem casos que já duram mais de 10 anos sem resolução. Pior que isso é a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal anulando portarias declaratórias de terras já em fase de regularização, a exemplo da Terra Indígena Porquinhos, no Maranhão, e ainda o que dizer de juízes que dão ordem de despejos sem conhecer a situação da área e da população?
 
- Nos causa indignação e revolta a opção do atual governo estadual pela implementação do MATOPIBA (anunciado como projeto de modernização agrícola nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), que irá destruir a última reserva de Cerrado e só atualiza o modelo colonial sobre as comunidades tradicionais, povos indígenas, quilombolas e áreas campesinas;
 
- A não regularização e reconhecimento dos territórios quilombolas ainda é uma vergonha e um grito que fere os nossos ouvidos, num Estado formado predominantemente pelo povo negro;
 
- A privatização de áreas de usufruto coletivo inviabilizando os modos de reprodução da vida de comunidades ribeirinhas, de praianos, de quebradeiras de coco, de sertanejos;
 
- É inadmissível que ainda hoje o Maranhão continue sendo um dos estados da federação que se destaca na exportação de mão-de-obra escrava. Pois, falta perspectiva de trabalho digno, de uma educação de qualidade, de cursos profissionalizantes e de políticas públicas que favoreçam a permanência dos trabalhadores e trabalhadoras no campo e na cidade. Isto atinge, de modo especial, a nossa juventude que vê seus sonhos se tornarem pesadelos.
 
- Tudo isso impactando no inchaço das periferias, causando o aumento da violência, do tráfico e uso de drogas, consequências da corrupção que desvia recursos públicos, violando direitos, negando políticas públicas, sobretudo de saúde e educação, em pequenas e médias cidades;
 
Anunciamos que pulsa no povo maranhense uma capacidade impressionante de resistência através da criatividade, da organização, da riqueza cultural, do fortalecimento e reconhecimento das identidades, das espiritualidades e da sabedoria. Somos um povo empobrecido pelas estruturas políticas e econômicas e sociais do Estado, mas um povo rico de vida, de natureza, de cultura e de inteligência e podemos afirmar que o Bem Viver já existe e está presente em muitas experiências, como a autogestão dos territórios, caso do povo indígena Ka'apor e Território Quilombola Rio do Curral, as experiências de economia solidária visibilizada na forca e garra das quebradeiras de coco, a retomada de territórios tradicionais, como do quilombo Charco e Quilombo Cruzeiro, a organização e articulação em teias e diversas redes de povos indígenas, geraizeiros, sertanejos, ribeirinhos, pescadores, quilombolas, quebradeiras de coco, extrativistas e assentados na partilha dos teres e dos saberes. Tudo isso se constitui como o Reino de Deus acontecendo entre nós.
 
Conclamamos a todos e todas que continuem firmes na luta pela tetra, pelas águas e por todos direitos que garantem a dignidade de filhos e filhas de Deus; que denunciemos com coragem as estruturas geradoras de exclusão e desigualdades e não nos calemos nunca diante da injustiça, da violência e da morte; que sejamos capazes de assumir junto com os empobrecidos a defesa da vida e construção da sociedade do Bem Viver.
 
Que saibamos viver os princípios e valores da solidariedade, da reciprocidade, da acolhida, do respeito, da pluralidade, da construção coletiva e da igualdade nas nossas praticas cotidianas.
 
 
 
"Tire as sandálias, pois este chão é sagrado" (Ex 3, 5)
 
Chapadinha - Maranhão, 18 de outubro de 2015.

TI Arariboia: dois meses em chamas

Incêndio já consumiu 45% da Terra Indígena Arariboia, onde vivem o povo Guajajara e os Awá-Guajá isolados, que correm risco de vida. Indígenas afirmam que madeireiros provocaram os incêndios em represália ao combate à extração ilegal de madeira
Enquanto o mundo acompanha as tímidas negociações sobre as metas de corte nas emissões de CO2 para a COP 21, que acontecerá em Paris, o Brasil vê, impassível, uma das maiores terras indígenas do estado do Maranhão virar cinzas. O local, onde vivem mais de 12 mil pessoas do povo Guajajara e cerca de 80 indivíduos isolados do povo Awá-Guajá, tornou-se palco de um drama humanitário que tem sido completamente subestimado pelas autoridades. As ações de combate ao incêndio não conseguiram controlar o fogo, que se alastra há mais de dois meses, com uma média de 145 focos de calor por dia.
O incêndio florestal, que vem se configurando como um dos maiores da história do país, já consumiu cerca de 190 mil dos 413 mil hectares que constituem a TI, o equivalente a mais de uma cidade do Rio de Janeiro. Na última semana o fogo cresceu em proporções gigantescas, registrando uma média de 560 focos novos de calor a cada dia, em meio aos esforços dos brigadistas e dos indíos, que tentam apagar uma linha de fogo com mais de 100 km de extensão.
Desde o início do incêndio, em agosto, os Guajajara denunciam o envolvimento dos madeireiros ilegais afirmando que o fogo foi criminoso e provocado como forma de retaliação às ações de fiscalização independentes que coíbem a extração de madeira ilegal, realizadas pelos “Guardiões” da TI Arariboia.
Os chamados “Guardiões” são os índios que promovem o monitoramento autônomo de seu território. Esses grupos surgiram no contexto da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas e com a missão de ajudar a difundir práticas de gestão do território. Porém, ao logo do tempo, diante da omissão do Estado brasileiro em promover a efetiva defesa do território, acabaram obrigados a enfrentar os madeireiros. Conseguiram reduzir significativamente a extração ilegal de madeira na TI Arariboia, mas sofrem com as represálias.
As denúncias dos Guajajara sobre a atuação de madeireiros para provocar o fogo estavam sendo ignoradas pelas autoridades até meados de outubro, quando fiscais do Ibama que atuavam no combate ao incêndio foram atacados por um grupo armado dentro da TI. O chefe do setor de fiscalização do Ibama em Brasília, Roberto Cabral, que foi atingido por um tiro de espingarda, afirmou ao Jornal Nacional, da TV Globo, tratarem-se de criminosos que estão roubando madeira e “se dispõem a matar para continuar a atividade ilegal”. A Polícia Federal agora vai investigar o caso.
“Lamentavelmente, o Estado precisou ter um servidor do Ibama baleado para iniciar uma investigação que prove a autoria material dos incêndios propositais que se espalham ao longo do perímetro da terra indígena, especialmente no surgimento de novos focos de incêndio ao norte da TI, na região do município de Buriticupu”, afirma Danicley de Aguiar, da Campanha da Amazônia do Greenpeace.
Veja o mapa dos focos de calor na região:
Mapa com focos de calor de 19/08/2015 até 19/10/2015 detectados pelo sensor de satélite NPP-VIIRS (Fonte: http://www.inpe.br/queimadas)



















Índios isolados estão em risco
Além dos Guajajara, a TI Arariboia é lar de cerca de 80 índios Awá-Guajá que vivem  sem contato com não-índios. O avanço do fogo, no entanto, tem colocado esses grupos em perigo. Nos últimos dias, dois indivíduos foram avistados bem próximos à linha de fogo, e os brigadistas que combatem o incêndio estão encontrando diversos sinais da presença dos Awá-Guajá no interior da TI, como abrigos e cacimbas cavadas em busca de água.
O mapa dos focos de calor mostra também que esses grupos estão praticamente cercados pelo fogo, restando a fuga para o norte, onde também surgem novos focos de incêndios desde o dia 11 de outubro.  Relatos locais estimam tratar-se de uma questão de tempo para que os Awá-Guajá entrem em contato em busca de socorro.
Nos próximos dias o governo atenderá às reivindicações feitas pelos Guajajara em um protesto realizado no Ministério do Meio Ambiente, em Brasília, no dia 9 de outubro, passando a utilizar aviões e helicópteros no combate direto ao incêndio, lançando mão inclusive de retardantes químicos adicionados à água utilizada no combate ao fogo. O protesto ocorreu quando 25% da área já havia sido impactada pelas queimadas. Hoje, cerca de duas semanas depois, a área de impacto já corresponde a 45% da TI. A linha de fogo chegou a ter uma distância de 325 km somando todas áreas que queimaram os últimos dias. 
“Tão importante quanto combater as chamas é impedir a ação criminosa dos madeireiros que tentam impor o caos nas terras indígenas do Maranhão, numa estratégia de manter o Ibama ocupado no combate aos incêndios e dar continuidade ao saque de madeira nas TI’s invadidas”, conclui Aguiar.
Fogo também ocorre nas terras indígenas vizinhas
Além da TI Arariboia, outras terras indígenas foram incendiadas criminosamente, segundo os indígenas da região, como a TI Alto Turiaçu, que, a partir de 2013, também passou a ser protegida por seus guardiões, e que, a exemplo da TI Arariboia, continua sendo alvo de assédio madeireiro. Até 2014, segundo o Relatório de Violência contra os Povos Indígenas, publicado pelo CIMI, os Ka’apor foram alvo de 4 assassinatos e 19 tentativas de assassinatos.
No início de setembro, o Greenpeace esteve com os Ka’apor para apoiar o monitoramento autônomo feito pelos índios, que passou a integrar o uso de tecnologia às atividades de proteção do seu território tradicional. Relatos locais apontam que madeireiros colocaram fogo nas bordas da terra indígena e que algumas aldeias já estão cercadas pelas chamas.

Por: Greenpeace

Comunidades indígenas e tradicionais boicotam audiência do MMA sobre lei de biodiversidade

Protesto contra falta de consulta aos detentores de conhecimento tradicional na formulação e na regulamentação da Lei 13.123/2015 esvaziou a audiência pública, realizada na semana passada, em Brasília
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Debate promovido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), na semana passada, em Brasília, para colher subsídios para a regulamentação da Lei 13.123/2015 – que regula o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional – foi mais vazio do que o esperado. Povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares decidiram boicotar a audiência pública em protesto contra a forma como o governo vem conduzindo a formulação e regulamentação da lei. Eles também divulgaram carta aberta em que repudiam e pedem a revogação da lei, por ela ferir princípios constitucionais e seus direitos básicos.
“Estamos vivenciando um dos momentos de mais expressivos genocídios da nossa história, declaradamente por meio de grandes projetos, grilagem de terras, expropriação e invasão, assassinato de lideranças e muito mais”, afirma o documento. Ele expõe a violação dos direitos dos povos tradicionais e indígenas na formulação lei e o desrespeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que garante direito de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas sobre quaisquer medidas que afete seus territórios (leia a carta na íntegra no final da notícia).
“O tema, além de ser polêmico, é pautado por muita desinformação”, contestou Rafael de Sá Marques, diretor do Departamento do Patrimônio Genético do MMA, após a leitura da carta na audiência. Para ele, as críticas do documento não contemplam o real conteúdo da legislação: por exemplo, não se justificaria o receio de que de que povos e comunidades tradicionais não teriam direito ao uso de seus conhecimentos e de que não poderiam negar o acesso a seu patrimônio genético.
“O processo de regulamentação que está ocorrendo não contempla o que eles [povos indígenas e tradicionais] consideram adequado”, afirmou o procurador da República Anselmo Lopes. Ele destacou que essas comunidades e agricultores familiares vêm tendo “dificuldade de aceitar a lei, não só pelo conteúdo, mas pela forma como ela tramitou até ser aprovada”. Foi Lopes quem pediu para a carta ser lida na audiência.
César Carrijo, representante da Casa Civil, afirmou que a complexidade do tema teria impedido o governo de apresenar uma minuta de decreto na audiência, apesar de este ter sido o seu objetivo. Carrijo apresentou o que chamou de “minuta zero”, primeira sugestão da Casa Civil para a regulamentação de alguns pontos da lei. A proposta pode ser acessada no site do MMA e há espaço para envio de críticas e sugestões até 30/10.
“O governo está colhendo os frutos do que semeou ao formular uma nova lei sem consultar povos indígenas e comunidades tradicionais”, critica Nurit Bensusan, especialista no assunto e assessora do ISA. Ela argumenta que as oficinas regionais sobre a regulamentação organizadas pelo governo, quando muito, serviram para dar uma dimensão para os detentores de conhecimento tradicional da “afronta” que foi a tramitação e o texto da lei.
“A regulamentação pode, no máximo, mitigar alguns dos estragos, mas os direitos desses povos e comunidades foram desprezados. E pior, quem diz que a atitude deles, ao boicotar essa audiência pública, é derivada de desinformação, menospreza não apenas os direitos desses povos, como também sua inteligência”, conclui.
A audiência contaria com representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural, Reforma Agrária e Agricultura Familiar (Condraf) e Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT). Com o boicote, os representantes do governo foram acompanhados apenas por representantes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Lei de acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional
A Lei 13.123/2015 vai regular o acesso e exploração econômica do patrimônio genético brasileiro e dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade e à agrobiodiversidade.  Ela substituirá a Medida Provisória nº 2186-16/2001 e entrará em vigor em meados de novembro, mas necessita de um decreto para que seja implementada, pois seu texto remete mais de 30 pontos para a regulamentação.  Após uma tramitação apressada e pouco democrática, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei de em maio de 2015.
CARTA ABERTA DA OFICINA NACIONAL EM BRASÍLIA/DF
Nós, Povos Indígenas, Povos e Comunidades Tradicionais e Agricultores Familiares presentes entre os dias 19 e 21 de outubro de 2015, na oficina nacional referente à Lei 13.123/2015 que trata sobre acesso aos conhecimentos tradicionais, patrimônio genético e repartição de benefícios, vimos por meio desta repudiar a forma como o Estado brasileiro tem conduzido a discussão.
Primeiro, por violar nossos direitos constitucionais garantidos na Carta Magna de 1988, pela legislação ordinária e por Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil, tais como Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento; Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; Convenção da Diversidade Biológica; Convenção sobre a Diversidade de Expressões Culturais; Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura; Declaração Universal dos Direitos Humanos; Declaração e Programa de Ação adotadas na III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata (Durban, África do Sul); Declaração da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, de forma perversa e em razão desse cenário que ameaça a existência de absolutamente todas as populações indígenas, povos e comunidades tradicionais, os quais constituem a base da soberania e democracia constitucional do País.
Segundo, por burlar a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho no que concerne ao direito de consulta livre, prévia e informada, também endossado nos acordos acima citados.
Terceiro, pela recusa explícita em nos apresentar a minuta de Decreto da Lei 13.123 de 2015 ou qualquer outra proposta que trata da regulamentação da referida Lei, o que implica diretamente na obstrução e confronto direto com a própria Constituição Federal além dos acordos internacionais já mencionados.
Portanto, nestes termos, que fique claro que todas as oficinas regionais sobre a referida Lei, não pode tampouco deve configurar sob hipótese alguma caráter consultivo, visto que estas não preenchem os requisitos exigidos de como deve ser para uma consulta pública. E ainda, o desdém com que se referem a nós.
Estamos vivenciando um dos momentos de mais expressivos genocídios da nossa história, declaradamente por meio de grandes projetos, grilagem de terras, expropriação e invasão, assassinato de lideranças e muito mais, tudo isso ocasionado pela falta de vontade política clara quanto à regularização, demarcação e titulação dos territórios tradicionais (Terras Indígenas, Territórios Quilombolas, Reservas Extrativistas, Territórios de Fundos e Fechos de Pasto, Territórios das Quebradeiras de Coco Babaçú, Catadoras de Mangaba, Territórios de Povos de Terreiro, Retireiros do Araguaia, Pomeranos, RESEX Marinhas, Vazanteiros, Geraizeiros, Pescadores de água doce e salgada, caiçaras, pantaneiros, ilhéus, raizeiras, faxinalenses, benzedeiras) inclusive a garantia de Territórios Ciganos a fim que sejam oportunizados de manterem seus cultivos silvopastoris, expondo-nos a um processo devastador da nossa cultura, perda de identidade e de práticas tradicionais que ameaçam como nunca os PCTS do Brasil.
É inadmissível não ter assegurado nossos direitos consuetudinários de praticar a medicina tradicional e ancestral a partir dos nossos conhecimentos tradicionais. Nossos usos e costumes são passados e repassados de geração a geração a indivíduos escolhidos pela natureza e que segue rigorosamente rituais espirituais impossíveis de outras pessoas absorverem, que não sejam aquelas respaldadas por suas comunidades e principalmente por seus guias espirituais.
Nós, povos indígenas, povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares repudiamos a PEC 215/2000, na medida em que essa proposta aniquila os direitos territoriais conquistados, e exigimos seu imediato arquivamento.
Repudiamos terminantemente a Lei 13.123/2015 e exigimos de imediato que seja feito consulta livre, prévia e informada, conforme rege a Convenção 169 da OIT, bem como demais acordos internacionais ratificados pelo Brasil, de modo que seja revogada a referida lei por ferir princípios constitucionais.
Brasília/DF, 21 de outubro de 2015.
Por: Victor Pires
Fonte: ISA

Indígenas reivindicam recursos, reconhecimento de direitos e conhecimentos na COP-21

Representantes indígenas e organizações da sociedade civil alertam sobre a importância de um acordo climático que garanta a sobrevivência dos povos indígenas e tradicionais
Os povos indígenas querem ter acesso direto a financiamentos para projetos relacionados às mudanças climáticas e que seus conhecimentos tradicionais sejam incorporados ao novo acordo climático internacional como elementos de adaptação e inovação. Também demandam o reconhecimento de seus direitos e consideram que o acordo é uma questão de sobrevivência.
Esses foram os principais recados dados pelo Caucus Indígena na rodada de negociações realizada nesta semana em Bonn, na Alemanha, a última antes da próxima Conferência do Clima (COP-21), que será realizada em Paris, em dezembro.
O Caucus é o apelido do Fórum Internacional de Povos Indígenas sobre Mudanças Climáticas, instância da Convenção do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU) onde lideranças de povos indígenas de diferentes regiões do mundo discutem e tenta, aproximar conceitos e posicionamentos em relação a essas negociações (saiba mais sobre o Fórum de Povos Indígenas).
Ouvir as demandas dos povos indígenas e tentar refleti-las no acordo de Paris e prolongar esse diálogo foi a intenção declarada por Laurence Tubiana na reunião em Bonn, representante especial do Governo francês para a COP-21.
Hindou Ibrahim, liderança africana do Caucus Indígena, destaca em Bonn que o acordo do clima deve conter reconhecimento dos saberes tradicionais indígenas e o seu valor no contexto climático | Juliana Splendore
Hindou Ibrahim, liderança africana do Caucus Indígena, destaca em Bonn que o acordo do clima deve conter reconhecimento dos saberes tradicionais indígenas e o seu valor no contexto climático | Juliana Splendore
“Nós indígenas colocaremos muita energia para construir uma linguagem forte de direitos humanos, incluindo direitos indígenas e conhecimentos tradicionais indígenas no acordo”, afirmou Hindou Oumarou Ibraim, liderança africana do Caucus.
“Os povos indígenas trazem um enfoque do lado humano do problema, na perspectiva de resolver violações de direitos fundamentais e o deslocamento dos povos”, conta Estebancio Castro Días, liderança indígena Kunayala do Panamá
Membros dos governos da França e da Noruega explicaram aos líderes indígenas que pretendem defender a inclusão dos conhecimentos indígenas no texto de Paris. Já a proposta do Caucus de garantir acesso direto ao financiamento no combate e adaptação às mudanças climáticas é apoiada por países como a Noruega e organizações da sociedade civil. Líderes indígenas veem a COP21 como uma oportunidade para se concretizá-la.
Com posição favorável a essa proposta, a Guatemala reforçou a necessidade da construção de capacidades para que os países e populações mais excluídas possam participar dos fundos climáticos. O país explicou que, no seu compromisso nacional de redução de emissões (INDC, na sigla em inglês), os indígenas tiveram uma participação especial.
“É preciso reconhecer o papel dos povos indígenas nesse processo. Em muitos lugares eles estão sendo os verdadeiros protetores das florestas e podem contribuir enormemente para evitar que mais emissões [de gases de efeito estufa] aconteçam”, explicou Mark Luttes, assessor das negociações do WWF.
Sociedade civil reclama compromissos justos e mais ambiciosos
A sociedade civil lançou em Bonn o relatório denominado “Repartição Justa”, em evento organizado na véspera das negociações.  Ele explica como os objetivos de redução de emissões já registrados por 146 países – que englobam 87% das emissões globais de gases de efeito estufa – só atingiriam a metade da redução necessária, em 2030, para evitar que o mundo ultrapasse o aumento 2º C da temperatura média do planeta, limite considerado seguro pelos cientistas.  Os próximos 15 anos serão chave se queremos evitar os efeitos mais dramáticos da mudança climática, reforça o relatório.
Gráfico compara os compromissos de redução de emissões propostos pelos países (em vermelho), com o que seria uma redução justa (em cinza)
Gráfico compara os compromissos de redução de emissões propostos pelos países (em vermelho), com o que seria uma redução justa (em cinza)
Por outro lado, graças a uma metodologia que considera as emissões históricas e atuais e as capacidades dos países, o documento mostra o que seria uma repartição “justa” dos compromissos de redução de emissões. No acordo internacional anterior, o Protocolo de Quioto, havia uma solução binária, de países desenvolvidos e o resto. Agora, em um mundo mais complexo, é necessária uma maneira de estabelecer metas dependendo da responsabilidade e capacidade de cada país, explica Mark Luttes, do WWF. O relatório é um trabalho de consenso das principais organizações da sociedade civil que acompanham as negociações internacionais.
Segundo a metodologia, Estados Unidos, Japão e União Europeia estariam bem abaixo do nível de redução de emissões com o qual deveriam se comprometer. Rússia nem sequer registrou seu compromisso ainda. E o Brasil também não atingiria o nível de ambição adequado
Ambiente político quer evitar o fracasso de Copenhague
Segundo Manuel Vidal, presidente peruano da COP-20, o objetivo central da Conferência de Paris é fechar um acordo de longo prazo que incorpore todos os países. “Não podemos barganhar a vida”, declarou o co-presidente argelino Ahmed Djoghlaf na plenária em Bonn. Em suma: ninguém quer ver a negociação fracassar, como aconteceu em Copenhague, em 2009.
As palavras eloquentes e o objetivo nobre tropeçam nos contenciosos mais importantes, principalmente a promessa de US$ 100 bilhões que anualmente deveriam ser transferidos dos países desenvolvidos aos países em desenvolvimento a partir de 2020 para o financiamento climático.
Os países grupo G-77 e China não validaram o relatório feito pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que calcula que, em 2014, foram disponibilizados US$ 62 bilhões para o combate às mudanças climáticas
“É uma questão de vida ou morte.  Precisamos de financiamento agora e no futuro.  Paris terá sucesso se essa questão for parte do núcleo do acordo”, concorda a embaixadora da África do Sul, Nozipho Mxakato-Diseko.
Em uma reunião com os observadores de ONGs, em Bonn, Christiana Figueres, secretária executiva da Convenção do Clima, afirmou, em um tom mais otimista, que a ação climática será incrementada exponencialmente a partir 2015. Para ela, Paris deverá ser um divisor de águas: o centro de comando deve sair do espaço diplomático e espalhar-se nos países, cidades, empresas, para o conjunto da sociedade. “Senão não teremos feito nosso trabalho direito”, afirmou.
“Agora, precisamos urgentemente nos envolver no nível micro. As pessoas podem ser parte da solução, a pedra que cai na água e espalha as ondas”, destaca Iara Pietricovsky do Inesc. “Na Alemanha, quando tem uma enchente, todo o mundo entende que tem uma relação com o clima. Já no nosso Brasil, para as pessoas realizarem esse vínculo, é muito raro”, explica Pietricovsky.
Por: Por Juliana Splendore, de Bonn, e Carlos García Paret, de Paris
Fonte: ISA